Você sabe o papel da sua fazenda na emissão de gases de efeito estufa?

Maria Erika Picharillo
Trainee Exagro

Olá! Você sabe o papel da sua fazenda na emissão de gases de efeito estufa? Para iniciarmos a nossa conversa, vamos apresentar de forma simplificada como funciona o processo físico de efeito estufa (Figura 1, à esquerda). A maior parte da radiação solar emitida atinge a superfície da Terra. Esta radiação é, em parte, refletida pela Terra ao encontrar a superfície terrestre.

Dentro de nossa atmosfera, existe a presença de uma variedade de moléculas de gases e alguns desses gases capturam naturalmente esta radiação refletida, sob forma de calor. São gases como dióxido de carbono, metano e óxido nitroso, que não absorvem a energia das ondas que incidem através do sol, mas absorvem a energia das ondas de calor irradiadas da Terra. O aumento na quantidade de gases na atmosfera fez com que mais energia ficasse aprisionada, o que corrobora com o aumento da temperatura terrestre.

Na figura 1, à direita, podemos observar a representação do efeito estufa intensificado pela ação do homem. Atividades humanas, como combustão de combustíveis fósseis, mudanças no uso da terra  e agricultura, contribuem para o aumento dos níveis de dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) e outros gases captadores de calor, aumentando o efeito estufa natural e assim a temperatura da Terra.

Figura 1. Representação esquemática do processo de efeito estufa (à esquerda) e o reflexo do aumento de gases de efeito estufa causado pela intensificação da ação humana (à direita).

Adaptado: W. Elder, National Park Service, 2019.

Na figura 2, abaixo, são apresentados os principais gases de efeito estufa emitidos pelas atividades humanas e as porcentagens que eles representam nas atividades econômicas que levam à sua produção, em escala global. Apesar de ser registrada maior emissão de CO2, é importante a mensuração de outros gases, pois cada gás possui seu potencial de aquecimento global – (GWP, sigla em inglês de Global Warming Potencial). O metano (CH4) possui GWP 28 vezes maior que o CO2, enquanto que o GWP do óxido nitroso (N2O) é 265 vezes maior que o CO2. Como forma de tornar os gases de efeito estufa em uma única medida internacional, esses valores são expressos em equivalência em dióxido de carbono (CO2eq) (MCTIC, 2016).

De acordo com a Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos, podemos observar que, em relação às emissões globais nos setores da economia em 2016, o transporte, indústria e geração de energia representam 14%, 21% e 35% nas emissões totais de CO2eq (Figura 2).

Figura 2. Porcentagens da participação global dos principais gases de efeito estufa emitidos pelas atividades humanas e as porcentagens nas emissões totais nos setores da economia.

Fonte: Adaptado EPA – Environmental Protection Agency, 2016

Com relação à agropecuária e ao uso da terra, as emissões de gases de efeito estufa desse setor originam-se principalmente da agricultura (cultivo de colheitas), da atividade pecuária e do desmatamento. Deste montante, que representa 24% das emissões, cerca de 4,2% são oriundos da fermentação entérica de animais ruminantes, sendo que o CH4 e o CO2 são os principais gases eliminados para o meio ambiente por meio da eructação (popularmente conhecido como o arroto do boi).

A redução da produção do gás metano (que vem da decomposição dos carboidratos das células vegetais)      no rúmen pode ser obtido através da composição da dieta com utilização de grãos, utilização de ionóforos ou inclusão de ácidos graxos, ácidos orgânicos, taninos e saponinas na dieta. Essas estratégias, além de manipularem o ambiente ruminal, refletem em maiores ganhos e em consequente diminuição do tempo para que os animais sejam abatidos.

De acordo com dados a respeito das emissões no Brasil, o MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações) divulgou estimativas anuais que apontam para grande queda das emissões brasileiras de gases de efeito estufa a partir do ano de 2005,  como pode ser observado no gráfico da Figura 3. Essa queda é reflexo principalmente da diminuição no índice de desmatamento, o que significa menos áreas sendo abertas para a pecuária ou cultura de grãos.

Figura 3.  Emissões brutas de gases de efeito estufa no Brasil, por setor, de 1990 a 2014 (Tg = milhões de toneladas).

Em contrapartida, a produtividade em @/ha apresentou aumento no mesmo período, associada ao aumento do uso de estratégias para intensificar a atividade de produção pecuária. 

Figura 4. Evolução da área de pastagem e da produtividade pecuária.


Fonte: Athenago, dados Conab, Agroconsult, Agrosatélite, IBGE, Inpe/Terraclass, Lapig, Inpe/Prodes, Rally da Pecuária, Map Biomas, Embrapa, 2020.

Diante do apresentado, fica a pergunta:

Como a intensificação do uso de áreas, para aumentar a produtividade animal, impacta nas emissões de gases de efeito estufa no nosso ambiente?

No que diz respeito às pastagens, as plantas tem capacidade de converter o CO2 atmosférico em massa vegetal através da fotossíntese, da conversão de massa de forragem e raízes mortas em matéria orgânica e da manutenção da estrutura do solo. Como os solos das pastagens não são revirados anualmente, os sistemas de produção a pasto tem maior capacidade de sequestro de carbono.

Dentre os sistemas de produção a pasto mais comumente utilizados, podemos citar o pastejo contínuo, alternado e rotacionado. O manejo de lotação contínua pode promover redução da produção de forragem e do teor de matéria orgânica (MO) no solo. Dependendo da falta de assertividade nesse manejo, é comum encontrarmos consumo desigual de gramíneas pelos animais, pois enquanto algumas áreas são superpastejadas, outras acabam sofrendo subpastejo, passando do ponto ideal de corte, o que propicia queda de qualidade e redução da digestibilidade dessas gramíneas, condição que favorecerá maior emissões de CH4 pelos bovinos.  Além disso, a falta de assertividade no manejo de pastagem pode favorecer seu processo de degradação, ocasionando redução na produtividade, perda de MO do solo e emissão de CO2 para a atmosfera (Figura 5).

No manejo rotacionado, ocorre redução da seletividade, o que propicia consumo homogêneo das forrageiras. Como a forragem permanece em estado vegetativo por maior período de tempo e acumula mais massa no período de descanso do piquete, há um maior sequestro de carbono e maior qualidade da forragem, com consequente menor emissão de CH4 pelos bovinos. Outras práticas podem ser adotadas na redução das emissões de CO2, como adoção de sistemas silvipastoris, plantio direto, integração lavoura-pecuária, aumento da eficiência do uso de fertilizantes.

Com relação ao óxido nitroso (N2O) , pode-se dizer que é um gás produzido naturalmente nos solos através dos processos de nitrificação e desnitrificação. Os dejetos de bovinos em pastagens representam 36% das emissões de N2O, sendo que a maior parte de N é perdida através da urina dos animais. Essas emissões também são influenciadas pela distribuição dos dejetos, uso de fertilizantes nitrogenados e pelas características do solo.

Existem inúmeros fatores que contribuem direta e/ou indiretamente para aumento ou mitigação das emissões no sistema. No entanto, podemos contribuir de forma positiva para o sistema de produção, proporcionando sequestro de carbono e nitrogênio em áreas de pastagens, refletindo no aumento de produtividade e de sustentabilidade, sem a necessidade de exploração de outros tipos de biomas importantes para nosso país.

O fato é, podemos contribuir no controle do efeito estufa, desde que as pastagens sejam bem utilizadas e a produtividade seja elevada. Já estamos chegando ao fim da era da degradação e subutilização de pastagens!

Em breve iremos fazer uma postagem com o tema voltado as boas práticas da produção pecuária a pasto.

Obrigada pela atenção.

Até a próxima!

Material consultado para essa postagem:

BERCHIELLI, T.T.; PIRES, A.V.; OLIVEIRA, S.G. Nutrição de Ruminantes. 2ª edição. Jaboticabal: Funep, 2011. 616p.

EPA – Environmental Protection Agency. Global Greenhouse gas emission. 2017. Disponível em: <https://www.epa.gov/ghgemissions/global-greenhouse-gas-emissions-data>. Acessado em: jul. 2020.

IPCC Guidelines for National Greenhouse Gas Inventories. S. Eggleston, L. Buendia, K. Miwa, T. Ngara, K. Tanabe (eds), published by the Institute for Global Environmental Strategies, Hayama, Japan, on behalf of IPCC, National Greenhouse Gas Inventory Program. Disponível em <https://www.ipcc-nggip.iges.or.jp/public/2006gl/> acesso em Jul. 2020.

MCTIC – Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações. Estimativas anuais de emissões de gases de efeito estufa no Brasil. MCTIC: Brasília, DF, 3°ed., 85p., 2016.

Rally da pecuária. Tecnologia alavanca a produção de carne no Brasil. 2020. Disponível em: <http://www.rallydapecuaria.com.br/node/1657>. Acessado em: jul. 2020.

REIS, R. A.; RODRIGUES, L. R. A. Conceituação e modalidades de sistemas intensivos de pastejo rotacionado. In: PEIXOTO, A. M.; MOURA, J. C.; FARIA, V. P. (Eds). Anais do 14° Simpósio sobre manejo da pastagem.  Fundamentos do pastejo rotacionado. Anais . . . Piracicaba: FEALQ, 2005. p. 327.

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